Neste texto, falo da carência afetiva, a falta de estar com alguém, a falta de estar com outras pessoas. O homem é um ser que, por natureza, não gosta de viver sozinho e, por meio da comunicação e de sentimentos, cria à sua volta uma rede, maior ou menor, de relacionamentos para conseguir uma vida feliz.
Por vezes somos levados a acreditar que uma pessoa só deixa de se sentir carente quando tiver um companheiro ou companheira com quem vai passar o resto da sua vida, como se isso fosse uma espécie de garantia eterna de afeto. Mas, na vida real não é assim. A vida está cheia de relacionamentos que terminam pelos mais variados motivos. Para além da morte, as pessoas mudam de morada, mudam de trabalho, mudam as suas certezas e os seus propósitos de vida.
Por estas ou por outras razões, todos nós, numa fase da nossa vida ficámos mais sozinhos, tivemos uma quebra de convívio com alguém que nos era próximo e sentimos um estado de carência. A saudade faz lembrar a ausência daquela pessoa e traz de volta um sentimento de falta do carinho que, às vezes, até dói. Mas isso é normal. O problema aparece quando se cria um padrão de carência que, muitas vezes de forma inconsciente, conduz a comportamentos que transportam um sinal permanente de “carência emocional”.
Infelizmente, por estar nesta situação, a pessoa começa a mendigar amor e atenção de todas as pessoas que a rodeiam. Quando sai à rua só sente o vazio e o acentuar da sua solidão. Olha para as outras e todas lhe parecem pessoas felizes, muito bem acompanhadas. Claro que é um exagero de perspetiva e de perceção. E o pior, é que no meio de toda essa gente, parece não aparecer ninguém capaz de interagir, convidar e tirar essa pessoa da zona cinzenta em que se encontra.
Então, sente-se frágil e deixa de ser seletiva nos contactos que estabelece. Como não sabe como ultrapassar essa carência, acaba por se relacionar com qualquer pessoa, até mesmo algumas que, antecipadamente, sabe não lhe são nada favoráveis.
A maior parte desses relacionamentos acaba por se transformar numa “zona de sofrimento” pior do que aquela em que a pessoa se encontrava inicialmente.
Lidar com a solidão e carência
Primeiro ponto: ter consciência de que qualquer pessoa, ao longo da sua vida, durante fases maiores ou menores, passa por fases de alguma solidão. Geralmente são fases temporárias, circunstanciais… Todos passamos por isso e todos temos ou teremos, um dia, que enfrentar essa fase, o melhor possível.
Outro ponto: não associar a fase de solidão a pensamentos negativos sobre nós próprios. Por vezes, a solidão resultou de um relacionamento complicado em que emergiu uma rejeição por parte dos pais, filhos, companheiro/a, colegas, e isso pode fragilizar e atingir a autoestima e vir a desencadear a procura desesperada de “alguém” que nos trate e que nos ame como entendemos merecer.
Portanto, para começarmos a superar a carência é necessário melhorarmos a autoestima, valorizar tudo o que fizemos e conseguimos de positivo, até hoje, e perceber as potencialidades que continuam a dar sentido à nossa vida. Entender que é possível continuar a ter uma vida plena e que não precisamos necessariamente de alguém para nos sentirmos felizes. Saber que, no essencial, é a nós, e não aos outros, que cabe semear a alegria e a satisfação pela vida.
Finalmente, ter em conta que existem muitas outras pessoas que fazem sentido na nossa vida e que precisam de nós para muitas tarefas, projetos, “hobbies” ou apenas para desfrutar de bons momentos de convívio. Tudo isso pode ajudar a recuperar a nossa autoconfiança, reconquistar o prazer e entusiasmo pela vida e redescobrir um caminho para ser mais feliz.
Alf